Aquela história do ônibus que eu fiquei receoso em publicar pois posso ser processado

dogs no fretado

O que relato a seguir são pensamentos extremamente íntimos e pessoais. Não sei se você vai se comover ou me achar um sequelado, mas leia com a mão no coração. Respira fundo. Isso. Me dá um abraço e eleve seus pensamentos para ver o mais longe possível a desumanidade que narrarei daqui em diante. Deus no comando.

Eu sou um sujeito grande. As pessoas se assustam quando me conhecem, os amigos brincam comigo, as crianças comentam com as mães. “Nossa, que homem grande”. Durante toda a minha vida eu sempre fui o maior ou o vice maior no quesito altura, então estou acostumado às bênçãos e intempéries proporcionadas por minha compleição física.

Entretanto, neste ano estou descobrindo algo que parece ser minha kriptonita: as viagens diárias de fretado. Enquanto fazer novas amizades dentro da condução é legal pra caramba, passar horas por dia espremido ali não tem sido das experiências mais fáceis, confesso. Já desenvolvi algumas táticas para tentar obter o máximo conforto, mas no fim das contas eu sempre fico parecendo uma escultura dadaísta. Chego em casa dolorido, mas depois de uns alongamentos e um bom banho eu estou novo e pronto pra qualquer coisa. Se tivesse um exército de mim depois do banho, seríamos capazes de invadir e derrubar uma pequena republiqueta.

É claro que comigo as coisas nunca são simples assim, então a vida chega como o menino Neymar com a bola nos pés. Em alguns dias eu sou como o cara que quebrou ele na Copa, mas em outros, faço aquela marcação pesada e acabo sendo dibrado mesmo assim, levando o Rafa FC à derrota completa.

Era terça-feira de manhã. Entrei no ônibus e, até onde fui capaz de ver, só havia um lugar vago. Um único lugar no corredor (onde eu gosto de ficar). No assento da janela havia um senhor todo esparramado. Parecia que ele tava numa jacuzzi. Bração aberto e tudo mais, ocupando um lugar e meio. Eu não quero soar preconceituoso, ok? Mas essa é uma informação necessária: Ele pesava mais ou menos umas 10 arrobas.

Pensei “vou chegar na poltrona, o cara vai dar licença e valeu”. Tentei me sentar no meio assento que restava. Nada do cara se mover. Dei aquela empurrada de leve, meio “por gentileza, se não for te atrapalhar, posso ocupar 100% do meu lugar?”. O MALUCO ME EMPURROU DE VOLTA! E isso enquanto fingia que estava dormindo.

Pensei em falar (urrar, na verdade) alguma coisa, mas não quis atrapalhar os demais colegas com uma briga no ônibus (sim, já presenciei uma briga de verdade no fretado e sei o quanto é tosco). Neste ponto, muitos me condenariam. Não julgo. Eu mesmo me condenei mais tarde.

Quis brigar de uma outra forma: forçando o braço contra o dele e conquistando o máximo possível da minha poltrona, meio “desocupa meu lugar ou eu te dou um tiro”. Vale lembrar que eu sou franzino, então o braço do cara meio que “embrulhou” o meu com a gordura dele (novamente, sem preconceitos, apenas narrando a cena). Sabe quando você encosta o braço naqueles travesseiros da Nasa e o braço afunda? É a comparação mais próxima daquela situação.

Durante a manhã eu tenho cerca de 40 minutos de sono dentro do ônibus. Eu conto com esses minutos pra começar o dia descansado, e ao que parecia, não ia poder tirar meu cochilo.
Foram mais ou menos vinte minutos de empurra-empurra. Eu todo torto, espremido, e o senhor fazendo questão de ocupar 1/3 do meu lugar (que, inteiro, já não me comporta). Me questionei diversas vezes sobre o meu dever de falar algo. Eu devia falar, mas não queria acordar ninguém, nem gerar brigas. O culpado do meu sofrimento era eu mesmo no fim das contas.

Foi aí que o aloprado cedeu como que 10cm de espaço. Vitória! Num impulso, fui ocupar o espaço, mas aí todas as células do meu corpo, meio que em fila, vieram me avisar de algo. Não havia felicidade no rosto delas. Era como se aquele seu amigo viesse te contar uma verdade inconveniente. Ele tenta te animar para então dizer que aquela sua ex, que você ainda torcia pra ter volta, já estava namorando de novo. Sabe do que eu tô falando? Aquela coisa meio “ei, cara, não fica assim, beleza? Você vai sair dessa”.

Um a um, cada átomo do meu braço direito me avisou que o meu braço estava gelado. E não era aquele gelado gostoso do ar condicionado. Não era aquele gelado do sorvete usado numa brincadeira durante um carinho com seu cônjuge, tampouco o gelado na barriga que dá ao ver a mulher amada. Constatei que meu braço estava suado. Não apenas isso, mas estava EMBEBIDO em suor. E o suor não era meu.

Paralisado, desconfortável, sem sono… Se eu fosse um boneco do The Sims, todas as minhas barrinhas de bem estar ficariam no vermelho naquele momento. Eu simplesmente não conseguia acreditar que aquela era minha punição (merecida) por ter ficado calado.

Cheguei no trabalho e fui correndo lavar meu braço. Com soda cáustica.

Comentários

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *