Das alegrias da vida de criança, uma das maiores é quando recebemos um presente de aniversário, ainda mais se é algo que queremos muito!
Já tive amigos que gostavam de ganhar lapiseiras ou roupas quando eram pequenos, mas apesar de ser uma criança excêntrica também (eu gostava de Kenny G e do creme dental Kolinos), o pequeno Rafa também apreciava coisas normais de criança, como videogame, por exemplo.
É por isso que, quando soube que fariam uma festinha no meu aniversário de 9 anos, fiquei imaginando se finalmente ganharia um jogo novo de Super Nintendo.
Não me entendam mal. Os anos 90 eram diferentes de hoje, que você pode jogar 57 jogos diferentes todos os dias. Eu tinha o videogame há uns 3 anos, mas possuía apenas 2 jogos. Até hoje tenho todas as fases dos Donkey Kong Country 1 e 3 na memória muscular. Eu joguei esses games até gastar as pontas dos dedos, então seria legal ter um novo jogo pra variar um pouco.
No dia da festa, vesti a melhor roupa e fiquei aguardando os convidados. Peço desculpas se você estava nessa ocasião, mas honestamente só me lembro de um único momento deste dia: quando meus tios me deram uma caixa retangular toda embrulhada. Removendo a embalagem, me encontrei com um jogo do Scooby Doo em mãos. E não era uma versão qualquer! A caixa dizia que o game era 100% em português, algo raro para a época.
A verdade é que esse jogo não é lá um clássico do terror. Numa pesquisa rápida no YouTube, é possível ver que os monstros, bem… eles não são aquilo que se chamaria de assustador. Sério, acho que dá mais medo assistir Histórias que o Povo Conta no Programa do Ratinho. Ou ser obrigado a ir num show do Latino.
Mas deixando de lado roedores e pessoas oriundas de países sulamericanos, eu me caguei de medo daquele jogo. Era como se fosse uma visita ao Inferno e o controle do videogame fosse a mão do capeta me cumprimentando. Com o medo constante, eu corria dentro de casa sempre que precisava ir de um cômodo a outro sozinho. O pavor estava à espreita.
Isso, claro, não agradou muito meus pais, que agora tinham um bundamolinho dentro de casa. E um bundamolinho teimoso, que continuava tentando zerar o até então inocente jogo do Scooby Doo e correndo pela casa como se estivesse atrasado pra pegar o ônibus no ponto.
Claro que uma hora meus pais perceberiam de onde vinha aquele medo. Minha mãe sempre jogava comigo, tanto que muitas das memórias mais queridas que tenho desse período da vida são de jogatinas com ela. Foi num desses dias que o império da Hanna-Barbera sofreu uma grande baixa dentro de nosso domicílio.
Percebendo o meu pavor na hora que um dos monstros aparecia, minha mãe comentou com meu pai que talvez o jogo fosse o causador do Rafinha estar parecendo o Usain Bolt.
Meu pai sempre foi um homem muito sereno, e se tem algo em que ele é muito bom até hoje, é em aplicar lições emblemáticas.
Mais tarde naquele dia, meu progenitor pediu que eu entregasse o cartucho a ele. Pela costumeira calma dele ao pedir, não desconfiei do que estava para acontecer. Munido de um martelo, ele colocou o jogo sobre uma superfície e proferiu palavras que nunca vou esquecer: “Hoje eu estou destruindo o seu medo”.
PAAAAAAAAAAAAA!
Um golpe certeiro destruiu o plástico do cartucho tal qual o Thor destruindo a cabeça do Thanos. Não é exatamente esse tipo de cena que a gente pensa quando diz “papai é meu herói”, mas assim é a vida para todos aqueles que ousam desafiar vampiros e palhaços de 16 bits.
Não vou mentir: eu chorei. Aquela foi uma perda de 33% da minha coleção de jogos. Muitas empresas fecham as portas bem antes de atingir esse patamar de prejuízo.
Seja como for, meus pais realmente conseguiram me fazer esquecer aquela sensação de pavor e perseguição. Agora, se algum monstro tivesse a audácia de invadir nossos domínios, teria de encarar o lendário Martelo do Clã Zago.
Possivelmente meus tios nunca souberam dessa história, e é capaz que ficassem chateados ao descobrir que o presente deles foi quebrado. Mesmo assim, as coisas tiveram um final positivo. Todas as chances de eu querer comprar uma van e sair por aí explorando casas velhas e empoeiradas acabaram naquele dia.
Uma vida sem rinite tende a ser uma vida sorridente.
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